O
Ministério Público Federal (MPF) denunciou o delegado aposentado da
Polícia Civil Sílvio Fernando Nunes Silva por receber propina de dois
grupos investigados pela Operação Forró, ligados à exploração
de jogos de azar com uso de máquinas eletrônicas (os chamados
caça-níqueis) montadas com componentes de importação proibida. Em troca,
ele permitia a continuidade das atividades ilegais. Agora poderá
responder pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de
dinheiro e formação de quadrilha (art. 288, parágrafo único, do Código
Penal, em sua redação originária).
O
dinheiro - pelo menos R$ 58.170 - era recebido em espécie e acabava
depositado em sua conta, de forma fracionada para tentar fugir aos
mecanismos de controle. Os valores foram recebidos entre
setembro de 2011 e abril de 2013, quando Sílvio Fernando era titular da
Delegacia Especializada em Defesa do Consumidor (Decon), que incorporou
as funções da Delegacia Especializada em Costumes (DEC), responsável
pela repressão aos jogos de azar. A Justiça
Federal já determinou a indisponibilidade de bens do réu, até a quantia
de R$ 58.170.
Dos
demais envolvidos, o MPF aponta a relação direta dele com, pelo menos, o
policial militar reformado José Anselmo Soares Filho e o seu amigo
Wagner Miguel de Araújo Galvão, conhecido como “Novinho
do Gás”. Os dois ajudavam a dar proteção ao “grupo dos cariocas” e ao
“grupo de Paulinho”, que mantinham diversos pontos de jogos de azar na
capital potiguar.
Ambos
serviam de intermediários do delegado e cobravam uma média de R$ 3 mil
por semana de cada um dos grupos. “Em consequência das promessas e dos
repasses de vantagens pecuniárias indevidas, ele
(Sílvio) realmente se omitiu de seus deveres funcionais e viabilizou a
contínua exploração de jogos de azar”, ressalta a denúncia. Em 2013, a
movimentação financeira do delegado foi mais que o dobro de seus
rendimentos líquidos recebidos formalmente da Polícia
Civil.
Sacolinha -
A participação do delegado no esquema foi apontado por um dos líderes
do grupo dos cariocas, Eduardo Madureira, em acordo de colaboração
premiada. Segundo ele, pelo recebimento
das propinas o titular da Decon ficou conhecido como “Sílvio
Sacolinha”. Foram autorizados, então, os afastamento dos sigilos fiscal e
bancário e a análise dos dados revelou que Sílvio “efetivamente se
associou, de modo estável e permanente” aos dois grupos
criminosos.
Eduardo
relatou um encontro no estacionamento de um shopping de Natal para
tratar do pagamento de propina, do qual o próprio delegado participou.
Na ocasião foram cobrados R$ 7 mil para a abertura
de uma nova casa de jogos, além da quantia semanal. Somado a conversas
telefônicas interceptadas pela Operação Forró (deflagrada em dezembro de
2013), Sílvio Fernando também é citado direta ou indiretamente em
várias mensagens de celular trocadas pelos demais
criminosos.
Operações fakes
- Em uma dessas mensagens, eles falam de operações de combate
promovidas por outras delegacias e indicam que as ações eram
consideradas uma forma de “desmoralizar Sílvio”. Algumas vezes as ações
eram da própria Decon, contudo serviam mais como forma de
pressão para garantir que as propinas continuassem a ser repassadas.
Nesses casos, não eram adotadas todas as providências devidas. O
delegado lavrava simples termos circunstanciados de ocorrência e deixava
de apurar a provável prática do crime de contrabando,
não enviando os equipamentos para perícia e muito menos tomando medidas
para remessa dos elementos à Polícia Federal ou à Justiça Federal
Os
envolvidos chegaram a lamentar a saída de Sílvio da delegacia, em 2013, o
que dificultou o andamento dos “negócios” dos dois grupos. Há
conversações, inclusive, no sentido de buscar algum nome
que permitisse a continuidade do esquema de propina, já que com o
delegado que tomou o seu lugar não “teria esquema”. Os criminosos
reclamam que o novo titular teria dito que “vai atrás de tudo” e “falou
que vai moralizar a delegacia”. Também há diálogos lamentando
os pedidos recorrentes para que a propina paga fosse aumentada. Chegou a
se cobrar um valor de R$ 6 mil semanais de cada grupo, para que nenhuma
casa de jogos fosse reprimida.
Moto -
A proximidade de Sílvio com Wagner Miguel também ficou clara. Em um
computador deste, apreendido pela “Operação Forró”, foi encontrado
arquivo contendo planilhas de 2009 em que constam
pagamentos ao lado da menção: “moto Dr. Silvio”. O delegado declarou
que nunca teve uma motocicleta, porém as investigações do MPF
demonstraram que, na época e até hoje, existia e existe uma cadastrada
em seu nome. Diversos cheques de Sílvio, totalizando R$
6 mil, também foram emitidos para a empresa de “Novinho do Gás”,
mantido em nome de sua sobrinha.
Além da
condenação pelos crimes, o MPF requer o pagamento de danos morais
causados por suas condutas, “especialmente à imagem da Polícia Civil do
Rio Grande do Norte”, em um valor mínimo de R$ 58
mil, atualizado com juros e correção monetária; assim como a decretação
da perda de sua aposentadoria.
A ação penal irá tramitar na Justiça Federal sob o número 0802910-44.2019.4.05.8400.
Corrupção na pauta...
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