O decano do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Celso de Mello,
aproveitou a sessão desta quinta-feira, 12, que marcou a despedida da
procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para fazer uma defesa
enfática do papel do Ministério Público, que ‘não serve a governos, a
pessoas, não se subordina a partidos políticos’ e ‘não se curva à
onipotência do poder ou aos desejos daqueles que o exercem’.
Dentro do Supremo, a incisiva fala do decano foi interpretada como um
duro recado ao presidente Jair Bolsonaro, que indicou o
subprocurador-geral da República Augusto Aras para suceder a Raquel
Dodge no comando do Ministério Público Federal (MPF). Sem disputar a
lista tríplice, Aras foi visto como o candidato que melhor soube ler os
sinais de Bolsonaro quanto aos requisitos para nomeação ao cargo.
Bolsonaro já disse que quer um novo PGR que não seja “radical na
questão ambiental”, nem que aja como um “xiita”, nem “atrapalhe”
projetos de infraestrutura, sendo “alinhado” com o Brasil. O nome de
Aras ainda depende de aprovação do Senado.
“O Ministério Público não serve a governos, não serve a pessoas, não
serve a grupos ideológicos, não se subordina a partidos políticos, não
se curva à onipotência do poder ou aos desejos daqueles que o exercem,
não importando a elevadíssima posição que tais autoridades podem
ostentar na hierarquia da República”, discursou Celso de Mello, sem
citar nomes, na abertura da sessão plenária desta quinta-feira do
Supremo.
“O Ministério Público também não deve ser o representante servil da
vontade unipessoal de quem quer seja, ou instrumento de concretização de
práticas ofensivas aos direitos básicos das minorias, quaisquer que
elas sejam, sob pena de o Ministério Público se mostrar infiel a uma de
suas mais expressivas funções, que é, segundo o que diz a própria
Constituição Federal, a de defender a plenitude do regime democrático”,
completou o decano.
Desde que Bolsonaro assumiu o comando do Palácio do Planalto, Celso
de Mello tornou-se um dos principais defensores de direitos de minorias e
da liberdade de expressão dentro da Corte. O decano foi o relator de
uma das ações sobre a criminalização da homofobia, votando para
enquadrar a discriminação contra homossexuais e transexuais como crime
de racismo, em um voto histórico de 155 páginas que foi lido por seis
horas e meia. O julgamento contrariou os interesses da frente
parlamentar evangélica e do Palácio do Planalto.
No mês passado, em entrevista exclusiva ao Estado, Celso disse que
Bolsonaro “minimiza perigosamente” a importância da Constituição e
“degrada a autoridade do Parlamento brasileiro”, ao reeditar o trecho de
uma medida provisória que foi rejeitada pelo Congresso no mesmo ano
para retirar da Funai a demarcação das terras indígenas.
Recado duro seu moço.
Estadão Conteúdo
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