Era de se esperar, pelo discurso de posse, que Jair Bolsonaro
mantivesse o tom de campanha ao se instalar no Planalto. Mas não estava
no script que ele anteciparia tanto a próxima disputa, como se o país já
estivesse sintonizado em 2022.
O presidente levou pouco mais de três meses para rasgar a promessa de
não concorrer a outro mandato. “A pressão está muito grande para que,
se eu estiver bem, me candidate à reeleição”, disse, no início de abril.
Desde então, a autopromoção eleitoral se tornou mais frequente e mais
explícita. “Pegamos um país quebrado, mas se Deus quiser conseguiremos
entregá-lo melhor para quem nos suceder em 2026”, discursou, em julho.
Nas últimas semanas, Bolsonaro abriu uma nova etapa da campanha
antecipada. Passou a alvejar diretamente possíveis adversários no campo
antipetista. Entraram na mira o governador paulista João Doria e o
apresentador Luciano Huck, que voltou a desfilar como presidenciável.
Em 2018, Doria só faltou ajoelhar diante do favorito ao Planalto. Não
conseguiu uma foto com o capitão, mas lançou o slogan “Bolsodoria” para
forçar a dobradinha eleitoral.
Huck ensaiou ficar no muro, mas flertou com Bolsonaro na reta final
da campanha. Em vídeo divulgado a uma semana da eleição, disse que
“jamais” votaria no PT e que Bolsonaro tinha uma “chance de ouro” para
“amadurecer” e “ressignificar a política no Brasil” — seja lá o que isso
queira dizer.
Com a popularidade em queda, o presidente farejou a concorrência e
passou a tratar os dois como inimigos. “Olha a caixa-preta do BNDES
aparecendo aí! Apareceu aquela galerinha da compra de aviões por 3%,
3,5% ao ano. Que teta, hein? Que isso, hein, Luciano Huck?”, provocou,
na quinta-feira.
“Comprou também, Doria? Explica isso aí! Só peixe amigão do Lula, da
Dilma. E depois eu vejo o Doria falando: ‘A minha bandeira jamais será
vermelha’. É brincadeira, né? Quando ele tava mamando lá, a bandeira era
vermelha, com a foice e o martelo!”, tripudiou.
Bolsonaro admitiu que o financiamento dos jatinhos “não foi ilegal”,
mas emendou: “Eu não faria isso porque tenho vergonha na cara”. Em muito
eleitores, deve ter bastado para colar a ideia de que Huck e Doria
“mamaram”.
O apresentador refugou em 2018, mas parece animado para se lançar em
2022. Ele tenta se apresentar como um liberal progressista. Quer unir a
imagem de bom moço, cultivada semanalmente na TV, ao aval da velha
guarda tucana, que rejeita Doria. Entre seus conselheiros, estão
Fernando Henrique Cardoso e Armínio Fraga.
Doria quer se vender como um conservador menos radical que Bolsonaro.
Copia seu discurso antipetista, mas agora também se encorajou a
criticá-lo. Já condenou declarações pró-ditadura, que não o incomodavam
no passado, e disse que jamais promoveria um filho a embaixador.
Ao antecipar a campanha, o presidente tenta conter a fuga de
eleitores desiludidos. Ao mesmo tempo, joga luz sobre os concorrentes e
periga criar novos atritos no Congresso. Muita coisa deve acontecer até
2022, mas Bolsonaro já deixou claro que teremos mais três anos de
tiroteio eleitoral.
Bolsonaro em plena campanha seu moço.
O Globo
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