Ex-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe)
exonerado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), Ricardo Galvão afirmou
nesta quarta-feira (4), em evento na ABC (Academia Brasileira de
Ciências), que a questão da Amazônia começou a ser despertada após as
acusações, sem provas, do presidente contra ele.
“A repercussão internacional foi enorme. Minha reação ao presidente
foi forte. Teve repercussão. Ele disse que eu estava a serviço [de
ONGs], no dia seguinte jornalistas estrangeiros me ligavam. Isso começou
a despertar a questão da Amazônia”, apontou Ricardo Galvão.
Segundo o ex-diretor do Inpe, não quer dizer que o governo queira o
desmatamento, mas lhe chamam a atenção os discursos contra o aquecimento
global e contra a importância de manter as florestas em pé. Ele voltou a
criticar o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, sobre o tema.
“Sem levar no ponto de vista político, ele [Salles] tem uma visão
capitalista destruidora. Absurdo explorar minério em terra indígena.
Inclusive, o presidente do Brasil falou que o bom lá é explorar nióbio,
mas o Brasil já produz 90% do nióbio mundial, dominamos já o mercado.
Para que precisa ir em terra indígena explorar mais nióbio? Tem umas
coisas absurdas”, apontou Galvão. “Eles são muito despreparados.”
O ex-diretor do Inpe também acredita que o governo tenha recuado na
questão sobre a floresta após a repercussão mundial que o caso ganhou.
“Acho que [o governo] recuou e espero que recue mais, pois vai ser
insustentável para o Brasil, fica uma situação instável para um governo
frente até à sociedade brasileira. Em todo lugar agora as pessoas
perguntam sobre o Inpe, a população já tem a consciência de manter a
Amazônia”, declarou Galvão.
Galvão também diz que Salles, caiu no “canto da sereia do vendedor”
na adoção de um novo sistema de monitoramento de desmatamento na
Amazônia.
“Acredito que o ministro Ricardo Salles, de uma certa forma, tem duas
coisas que podem acontecer, uma é comprar isso com interesse não sei de
quem. O outro talvez seja uma justificativa pela não ação”, afirmou
Galvão, que foi homenageado pela ABC.
O governo pretende adotar um novo sistema de monitoramento privado,
nos moldes do oferecido por uma tecnologia americana disponibilizada no
Brasil pela empresa Santiago & Cintra. O sistema utilizado é o
Planet, que produz imagens mais detalhadas do que as do Inpe. A opção
voltou a ser questionada por Galvão nesta quarta.
“Nosso sistema de alerta tem uma faixa de varredura de pouco mais de
860 quilômetros. Se você abre muito o campo de visão, não vê nada em
detalhe. Nossa imagem não tem uma resolução para ver em detalhes. Mas as
áreas que damos são perfeitas para efeito de fiscalização, de coibir o
desmatamento, isso sempre funcionou, o que levou de 2004 a 2012 uma
queda abrupta na questão do desmatamento”, disse o ex-diretor do Inpe.
“A questão de resolução maior [como quer o governo], com três metros
quadrados, é para ver em detalhes. Quero fazer uma ação legal contra um
proprietário, aí eu olho em detalhes. Mas imagine três, quatro metros
quadrados. Então, imagine cobrir a Amazônia com seus quatro milhões de
quilômetros quadrados em um pedacinho de dois por dois?”, questionou
Galvão.
“Você tem é que usar o sistema Deter, aí tem um alerta de
desmatamento, vê onde ocorreu, e aí sim você pega essa área e vê em
detalhe”, acrescentou. Ele também relatou que o ministro do Meio
Ambiente não gostou de sua análise. “Ele ficou muito aborrecido comigo,
porque eu disse a ele que não se mede a distância São Paulo-Rio com uma
régua de 10 centímetros”.
No último dia 22 de agosto, Salles criticou o sistema mencionado por
Galvão. “O Deter não se presta a medir volume de desmatamento, não é
preciso e não faz comparações. Para saber se o desmatamento aumentou, é
preciso comparar a mesma área em tempos diferentes. O Deter não faz
isso”, opinou o ministro do Meio Ambiente.
No último dia 2 de agosto, Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia)
decidiu exonerar Ricardo Galvão, após críticas a dados sobre
desmatamento considerados sensacionalistas pelo governo. Segundo ele, o
motivo de sua exoneração foi porque seu discurso em relação ao
presidente Bolsonaro criou constrangimento.
Recado dado.
Folhapress
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