O Supremo Tribunal Federal (STF) discute hoje a necessidade de
autorização judicial prévia para o compartilhamento de informações
sigilosas por órgãos de fiscalização e controle, como a Receita Federal e
o antigo Coaf, rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira (UIF).
Com expectativa de placar apertado, o resultado do julgamento pode
abrir brecha para anular a investigação sobre a prática de “rachadinha”
no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) na Assembleia do Rio,
além de causar impacto em outros 934 processos.
O julgamento do recurso é considerado crucial para o Ministério
Público do Rio (MP-RJ). Se o Supremo decidir que é necessária
autorização prévia para o compartilhamento das informações, volta à
estaca zero a investigação sobre a suspeita de um esquema de divisão de
salários dos assessores parlamentares de Flávio quando ele era deputado
estadual, do qual faria parte Fabrício Queiroz, como revelou o Estado. Os promotores teriam que recomeçar o processo, solicitando formalmente os dados à UIF.
Questionado sobre como atuaria nesse cenário, o MP-RJ não respondeu.
No fim de semana, os promotores cariocas pediram a Toffoli que casos
como o de Flávio não devem estar no escopo do recurso que será
analisado.
Relator da ação que será julgada hoje, o presidente do Supremo, Dias
Toffoli, determinou em julho a suspensão de diversos procedimentos de
investigação apoiados em dados fiscais e bancários compartilhados sem o
aval prévio da Justiça, o que beneficiou o filho do presidente Jair
Bolsonaro. Entre os processos paralisados estão investigações sobre
crimes contra a ordem tributária, relacionados à lavagem ou ocultação de
bens, além de apurações sobre crimes ambientais na Amazônia,
contrabando e corrupção. Se o Supremo decidir que é necessária a
autorização de um juiz para o envio dos dados, a Lava Jato sofrerá mais
uma derrota.
Em memorial encaminhado ao Supremo, o procurador-geral da República,
Augusto Aras, alertou os integrantes da Corte que limitar o
compartilhamento de informações da UIF com o Ministério Público e a
Polícia pode “comprometer tanto a reputação internacional do Brasil
quanto sua atuação nos principais mercados financeiros globais”. Segundo
Aras, a depender da decisão, o Brasil pode ter dificuldade de acesso a
créditos internacionais para projetos de desenvolvimento e a redução do
rating de investimento por agências internacionais.
Aras quer que a liminar de Toffoli seja revogada pelo plenário do
Supremo, o que, na prática, permitiria o destravamento do caso da
“rachadinha” envolvendo Flávio Bolsonaro e Queiroz.
Modulação. Conforme informou ontem o Estado,
Toffoli costura um voto que imponha limites ao compartilhamento de
informações pela Receita e pela UIF, mas que não seja visto como ameaça
ao combate à corrupção. O ministro deve fazer uma distinção em seu voto
sobre os procedimentos adotados pelos dois órgãos.
A expectativa dentro do Supremo é a de que o tribunal fixe critérios
para o repasse de dados sigilosos, em uma discussão que deve mais uma
vez rachar o plenário.
Uma das questões que serão discutidas é se os órgãos poderão informar
apenas valores globais mensalmente, ou seja, informações genéricas, sem
maior detalhamento. Esse ponto foi criticado por Aras, para quem o
compartilhamento das informações não depende de autorização judicial.
Também deve ser discutido se o resultado do julgamento valerá para
todos os casos ou apenas para aqueles que tiverem pedido de informações à
UIF e à Receita após a decisão do plenário. O ministro Alexandre de
Moraes criticou a possibilidade de modular os efeitos da decisão. “Se a
maioria entender que é inconstitucional, é nulo. Levando em conta que
são direitos fundamentais pode modular? Pode, mas precisa de oito
votos”, disse o ministro.
O caso concreto que será analisado pelo Supremo é de um processo de
sonegação fiscal envolvendo donos de um posto de gasolina em Americana
(SP). A defesa dos empresários acusam a Receita de extrapolar suas
funções ao repassar dados sigilosos sem aval da Justiça.
O processo ganhou repercussão geral, ou seja, o entendimento firmado
pelo Supremo neste julgamento deve ser aplicado para outros casos nos
diversos tribunais do País. / COLABOROU CAIO SARTORI
Onde tá aquela turma da moral seu moço?
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