Maitê Proença, atriz; Moreira Franco,
ministro do governo Temer; Ricardo Boechat, jornalista; Roberto Kalil,
médico; Marcelo Crivella, prefeito do Rio de Janeiro; Sérgio Bermudes,
advogado.
João Doria, governador de São Paulo; Roberto D`Ávila, jornalista; José Dirceu, ex-ministro do governo Lula; Roberto Medina, criador do Rock in Rio; Jair Bolsonaro, presidente eleito da República.
O que essas figuras – de ramos tão diferentes quanto entretenimento,
direito, mídia, medicina e política – têm em comum? Todas são ou foram
muito próximas de um mesmo personagem, o executivo Paulo Marinho.
Marinho, 68 anos, é um mestre na arte de fazer amigos. É descrito
pelas pessoas que o conhecem como simpático, bom de conversa,
envolvente. Ele, contudo, se recusou a dar entrevista para esta
reportagem.
Avesso a aparições públicas nas últimas décadas, Marinho voltou a
ganhar os holofotes em 2018 depois que sua mansão no Jardim Botânico,
bairro nobre do Rio, se transformou no principal quartel-general de Bolsonaro.
Ele se envolveu diretamente na campanha do ex-militar e montou em sua
residência um estúdio para a gravação das peças publicitárias. Os
jornalistas se acotovelavam no seu portão, porque era um dos poucos
lugares onde o candidato que liderava as pesquisas ia regularmente.
Depois da vitória, a casa abrigou ainda a primeira reunião da equipe de transição e André Marinho, filho do executivo, atuou como tradutor no telefonema entre Bolsonaro e o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
Bolsonaro e Marinho eram, portanto, próximos, mas não podiam ter
backgrounds mais diferentes. Enquanto Bolsonaro vem de uma família de
classe média baixa e tem valores conservadores, o executivo frequenta a
alta sociedade carioca e, na juventude, gostava de badalação e belas
mulheres.
Nascido no Rio de Janeiro, em 1952, Paulo Marinho começou a trabalhar
aos 14 anos como uma espécie de ajudante de ordens de Ronaldo Xavier de
Lima, dono da Excelsior Seguros, marido de Marta Rocha, ex-miss Brasil,
e um dos maiores playboys da cidade.
Pouco tempo depois, o jovem passou a atuar em corretoras no
incipiente mercado financeiro do Rio e a ganhar dinheiro. Tinha 21 anos
quando conheceu a estonteante atriz francesa Odile Rubirosa.
Aproximou-se do mundo do entretenimento e da mídia e tornou-se amigo de
jornalistas renomados como Zózimo do Amaral, Roberto D`Avila e Ricardo
Boechat.
Já separado de Odile, ele se enamoraria de Maitê Proença, com quem
teve uma filha, Maria. Liberal, não se importou que a atriz pousasse nua
para a Playboy. Os dois não chegaram a se casar para que Maitê
mantivesse a pensão que recebia do pai, ex-militar.
MOREIRA FRANCO
O envolvimento mais intenso de Marinho com a política começaria na
década de 80. Convidado por Boechat, ele ajudou na vitoriosa campanha de
Moreira Franco ao governo do Rio em 1986. O jornalista se tornaria
secretário de Comunicação estadual, mas Marinho preferiu não ir para o
governo.
O executivo começaria ali um padrão que se repetiria por toda a vida.
Nunca ocupou um cargo público e sempre preferiu o setor privado,
utilizando seus contatos na política para fazer negócios.
Sua amizade com Moreira Franco, por exemplo, o ajudaria em sua nova
empreitada ainda no início da década de 90: o Rock in Rio. O festival
havia acontecido pela primeira vez em 1985, mas sofreu ferrenha oposição
do então governador Leonel Brizola (PDT).
Com Moreira Franco no poder, o publicitário Roberto Medina,
idealizador do evento, recorreu a Marinho para conseguir apoio político.
Ainda assim, por pouco, o Rock in Rio quase não saiu. Uma liminar
chegou a cancelar o festival, alegando que o estádio do Maracanã não
estava preparado para receber tantas pessoas.
Marinho e Medina derrubaram a liminar, mas foram obrigados a reforçar
com estacas toda a arquibancada do Maracanã, o que elevou os custos. O
evento aconteceu em 1991 e foi um enorme sucesso, mas gerou pesados
prejuízos para os dois.
Em meio a esse embate jurídico, Marinho passou a ir com frequência ao
escritório do advogado Sérgio Bermudes, contratado para cuidar do Rock
in Rio. Foi neste momento que o empresário foi apresentado pela primeira
vez ao jovem Gustavo Bebianno, estagiário do escritório.
Marinho e Bermudes ficaram muito amigos. O empresário se casou com
sua terceira esposa, Adriana, em uma cerimônia na casa do advogado,
celebrada por um juiz amigo dele: Luiz Fux, hoje ministro do Supremo
Tribunal Federal (STF).
Também foi Bermudes que apresentou Marinho a um dos seus maiores
parceiros de negócios, com quem ele trabalharia por 17 anos, e hoje um
dos poucos inimigos desse bon-vivant: o empresário Nelson Tanure.
O baiano Tanure era especialista em comprar empresas quebradas,
assumir seus litígios na Justiça e ganhar dinheiro com isso. Ele
contratou Marinho para ser diretor de sua nova investida, o estaleiro
Verolme.
Sediado em Angra dos Reis, o Verolme foi comprado em concordata, mas,
ainda assim, chegou a empregar quase 4.000 pessoas depois de conseguir
contratos bilionários com a Petrobras para a construção de plataformas
de petróleo.
A fim de vencer as licitações, o estaleiro baixava os preços e ficava
na expectativa de obter aditivos que compensassem os custos e gerassem
lucros. Deu confusão. A Petrobras passou a cobrar o Verolme por
plataformas fora da especificação, enquanto o estaleiro acusava a
estatal de mudar o projeto sem elevar os preços.
A disputa foi parar na Justiça e começou a se arrastar. Marinho
decidiu sair do estaleiro e acertou com Tanure, como parte de seu pacote
de desligamento, um porcentual no contrato com a Petrobras. Logo em
seguida, ele foi trabalhar para outra figura bastante polêmica – o
banqueiro Daniel Dantas, do Opportunity.
Dantas queria que Marinho utilizasse seus contatos para o ajudar
entrar no capital da antiga Telemar, operadora de telefonia do Rio. O
negócio foi bem-sucedido, mas Marinho e Dantas se desentenderam. Até
hoje não se gostam.
Nesse período, a revista Veja revelou um diálogo entre Marinho e
Boechat. Na conversa, o repórter de O Globo lia para o amigo e fonte uma
matéria que escrevia sobre a briga de Dantas com os demais sócios. O
escândalo provocou a demissão do jornalista.
Marinho então voltaria a trabalhar para Tanure, dessa vez no Jornal
do Brasil, outra empresa em dificuldades financeiras que havia sido
adquirida. Lá reencontraria Bebianno, que atuava como diretor jurídico.
No JB, Marinho foi contratado como vice-presidente de assuntos
governamentais. Sua função obrigou-o a se mudar para Brasília, onde
viveu de 2003 a 2006, época do primeiro mandato do ex-presidente Lula.
A capital federal ampliou seus horizontes na política, porque até ali
ele era bem relacionado apenas com nomes cariocas. Além de Moreira
Franco, conversava com frequência com o então prefeito Eduardo Paes e
com o governador Sérgio Cabral, hoje preso por corrupção, entre outros.
Em Brasília, costumava dar jantares memoráveis em sua suntuosa casa
no Lago Sul e quase sempre era agraciado com a presença dos três “Zés”:
José Sarney (MDB), presidente do Senado, José de Alencar (PL),
vice-presidente da República, e José Dirceu (PT), ministro da Casa
Civil.
Ele havia conhecido Dirceu em um evento do JB para o qual o convidou
como palestrante. Os laços entre os dois acabaram se tornando tão
estreitos que, quando o petista caiu em desgraça no mensalão, Marinho
tratou de ajudá-lo.
Conversou com deputados para tentar impedir a cassação do mandato de
Dirceu na Câmara, o que acabaria ocorrendo, e chegou até a contratá-lo
como colunista do JB. Dizem pessoas próximas que o real motivo era
ajudar Dirceu, que enfrentava uma situação financeira delicada.
Além de cuidar dos interesses do jornal, Marinho também utilizava
seus contatos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para ajudar Tanure
na antiga disputa com a Petrobras.
O empresário acabaria vencendo o processo, obtendo quase R$ 200
milhões de indenização, pagos por seguradoras contratadas pela estatal.
Marinho acreditava que tinha direito a uma parte do dinheiro, por
causa do acerto feito quando saiu do estaleiro Verolme. Tanure
discordava. Os dois romperam e se enfrentam há anos nos tribunais no
Brasil e nos Estados Unidos.
Já foram condenados em diferentes instâncias a pagar milhões um para o
outro e finalmente estariam perto de um acordo. Interlocutores de ambos
dizem que eles querem encerrar a disputa.
Desde esse período, Marinho não tem patrimônio em seu nome, para
evitar bloqueio judicial. Doou tudo que possuía para a esposa, com quem é
casado com separação de bens. Sua declaração de imposto de renda revela
posses de pouco mais de R$ 700 mil, o que é incompatível com seu estilo
de vida.
JOÃO DORIA
Marinho então voltou para o Rio e passou a trabalhar como consultor.
Os anos se passaram e, com a eleição de 2018 se avizinhando, ele decidiu
apoiar o tucano João Doria para a Presidência da República.
Doria acabara de ser eleito prefeito de São Paulo em primeiro turno.
Organizou para o amigo paulistano dois jantares, com cerca de 200
pessoas cada um, a fim de apresentar a ele a elite do empresariado
carioca. Um dos eventos ocorreu no refinado Country Club do Rio; outro
em sua própria casa.
O nome de Doria, contudo, não decolou dentro do PSDB e Marinho ficou
sem candidato até receber um telefonema de Bebianno, que tinha se
tornado o faz-tudo de Jair Bolsonaro.
No fim de 2017, Bebianno levou o ex-militar para um jantar na casa de
Marinho. Seu filho André também participou da conversa. A empatia teria
sido imediata e, a partir daí, o executivo só se refere ao presidente
eleito como “o capitão”.
Quando o então candidato sofreu uma facada em Juiz de Fora (MG), foi o
executivo que mobilizou o Hospital Sírio Libanês, por intermédio do
cardiologista Roberto Kalil, para atendê-lo. O político, porém, acabou
se tratando no rival Albert Einstein.
Marinho também foi convidado por Flávio Bolsonaro, o filho mais velho do presidente eleito, para ser seu suplente no Senado. Caso Flávio se candidate a prefeito do Rio em 2020 —o que ainda depende de uma interpretação da lei eleitoral —, seria o primeiro cargo público da vida de Marinho.
Interlocutores que o conhecem diziam que ele não almeja ser senador e
preferia continuar fazendo o que sempre fez: cultivando amigos e
fazendo a ponte entre a iniciativa privada e os políticos.
Em 2019, no entanto, ele se filiou ao PSDB e se lançou como
pré-candidato à prefeitura do Rio de Janeiro para as eleições deste ano.
CONSTRUINDO PONTES
Anos de 1970
Passa a frequentar o mundo do entretenimento; conhece a atriz Maitê Proença, com quem vive mais de dez anos e tem uma filha
Anos de 1980
Participa da eleição de Moreira Franco ao governo
do Rio de Janeiro;
vira parceiro do publicitário Roberto Medina na realização do Rock in Rio
Anos de 1990
Amplia contato com o advogado Sérgio Bermudes
e com o então juiz
Luiz Fux; trabalha com
Nelson Tanure e com
Daniel Dantas, do Banco Opportunity
e com o então juiz
Luiz Fux; trabalha com
Nelson Tanure e com
Daniel Dantas, do Banco Opportunity
A partir de 2000
Estreita laços políticos; em Brasília, torna-se amigo de José Dirceu;
aproxima-se de João Doria; por intermédio do advogado Gustavo Bebianno,
conhece Jair Bolsonaro.
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