Há personagens reais que ganham um tom meio folclórico e, de tão
peculiares, se tornam famosos e inesquecíveis. Barruada e seu carrinho
de cachorros-quentes fazem parte da paisagem da Rua Dom Bosco, no Centro
do Recife, e alimentam há mais de 45 anos os alunos e ex-alunos do
Colégio Salesiano. Difícil achar quem tenha estudado na instituição e
não o conheça. Foi esse mundo de gente que ajudou Barruada a “enfrentar
uma batalha”. Em um vídeo, ele agradece as doações e diz que já recebeu
dinheiro suficiente. A história viralizou.
Foi no boca-a-boca entre os muitos ex-alunos do Salesiano que Barruada
foi recebendo ajuda. Depósito e mais depósitos, muito mais dinheiro do
que ele esperava. A última contagem, segundo amigos, chegou a tal valor
que ele achou suficiente. Agradeceu e pediu para parassem com as
doações.
“Ô, meu filho, aqui é Barruada, que pediu ajuda a vocês. A gente estava
olhando a conta aqui que vocês fizeram os depósitos e a gente estava
pensando em parar. Vamos parar, por favor, um pouco. O que vocês me
ajudaram já dá para vencer a batalha. Peço a vocês, por favor, parem. Se
precisar, a gente pede a vocês de novo. Muito obrigado pela ajuda”,
disse, no vídeo. A gravação termina com ele devolvendo o celular de
forma abrupta. O jeito peculiar que faz jus ao apelido.
arruada é Joaquim Antonio e chegou à
Dom Bosco em meados de 1975, onde o carrinho ainda está até hoje, gerido
pelo filho, Mário. “Ele não dava um sorriso pra ninguém, sempre foi
muito sério. Foi a gente que colocou o apelido. No começo, ele não
gostava, ficava bravo. Depois, aderiu”, conta o engenheiro civil Paulo
Falcão, que estudou no Salesiano entre 1971 e 1979.
Todo mundo lembra de Barruada por sua legítima fama de brabo. “A turma
perturbava muito com ele, que se defendia”, relembra Paulo. Outros
alunos lembram, rindo, da irritação que Barruada ficava quando o tumulto
se formava em volta do carrinho. Venda no fiado, com nome no
caderninho, somente para algumas pessoas. “Quando vi que ele estava
passando por dificuldades, procurei logo ajudar. Acho que quem passou
pelo Salesiano vai se lembrar porque ele faz parte. É como se fosse um
amigo de lá”, diz Paulo.
A turma de Paulo faz festas para relembrar os tempos de escola
periodicamente e, em 2014, incluiu Barruada e seus cachorros-quentes na
comemoração. “A comissão teve a ideia de chamar ele. Compramos uns 300,
foi muito bom”, diz, mostrando as fotos da festa em que Barruada aparece
sorrindo. “Ele fazia parte do Salesiano. Se você abrir o Google Maps,
vai achar o cachorro-quente dele lá na Dom Bosco”.
Em tempo: apesar de muitas tentativas, Barruada não atendeu às ligações
da reportagem. Amigos e parentes relataram que ele ficou incomodado com a
repercussão dos vídeos.
"Cheio de amor"
Também ex-aluna do Salesiano, Cecília Vilaça tem uma visão incomum sobre
Barruada e diz que ele "tentava ser bravo, mas era a barraquinha que
estava sempre cheia". "E não era só pelo cachorro-quente gostoso que ele
fazia. Era pelo senhor bruto, mas cheio de amor que a gente encontrava
lá. Ele sabia quando a gente queira completo e colocava um pouquinho a
mais do que a gente gostava quando a gente reclamava. Tinha que ter 'a
graça' da briga de pedir para ele negar e reclamar e depois vir com a
colher colocando mais um pouquinho da nossa porção preferida. Só não
podia sujar, aí lá vinha ele com a flanela limpando tudo que via pela
frente", relembra.
"Ele muitas vezes nos cedeu, foi ele que nos deu, quando recebi a
notícia que ele estava precisando de ajuda, foi imediato os grupos das
turmas, dos anos foram se mobilizando. No final ele nos deu uma bela
lição de honestidade. Falei com a neta dele, Camila, e ela, muito
emocionada, disse que ele estava sem acreditar. A única coisa que pude
dizer a ela foi que nessa vida colhemos o que plantamos e ele está
colhendo isso".
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Diário de Pernambuco
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