A Câmara dos Deputados aprovou
nesta quarta-feira (5), por 317 votos a 111, um projeto que suspende os efeitos
de uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
(Conanda), de dezembro de 2024, que regulamenta o direito de menores ao aborto
legal.
Hoje, as possibilidades de aborto
legal são: feto anecéfalo, risco de vida para a gestante e gravidez decorrente
de violência sexual.
Na prática, o projeto em
discussão pode dificultar o aborto legal para adolescentes nesses casos.
A resolução do Conanda
estabeleceu os procedimentos a serem adotados na identificação da gravidez em
crianças e adolescentes e permite o aborto nas situações já previstas em lei.
O relator do projeto foi o
deputado Luiz Gastão (PSD-CE), coordenador da Frente Parlamentar Católica. O
projeto foi colocado em pauta após ter sua tramitação em regime de urgência
aprovada minutos antes, com amplo apoio dos partidos de centro e de direita. A
base governista se manifestou contra a urgência.
“A interrupção legal da gestação
é um direito humano de crianças e adolescentes vítimas de violência sexual,
estando diretamente relacionado à proteção de seus direitos à saúde, à vida e à
integridade física e psicológica, bem como ao pleno exercício de sua
cidadania”, diz a resolução.
A resolução, que entrou em vigor
em janeiro de 2025, destaca que a gestação em crianças e adolescentes é um
processo que “representa risco à saúde física, psicológica e mental que pode
resultar em impactos sociais no seu pleno desenvolvimento, aumento de
adoecimento, incapacidade e mortes”
“A interrupção legal da gestação
para crianças e adolescentes constitui parte das ações de prevenção a morbidade
e mortalidade”, diz o texto.
Argumentos a favor do projeto
Os parlamentares a favor do
projeto, maioria de oposição, argumentam que o texto do Conanda permite o
aborto sem o consentimento dos pais.
Segundo eles, a norma “institui
uma autonomia decisória completa, que dispensa qualquer tipo de autorização dos
pais ou dos responsáveis pela criança”.
“Sendo assim, prevê, na prática,
uma submissão quase compulsória ao procedimento de aborto, que, por sua vez,
pode implicar em graves risco à vida da gestante que, por força da legislação
vigente, não é capaz de autodeterminar-se”, afirmou a deputada Chris Tonietto
(PL-RJ).
Governo é contra
Após aprovação do projeto, o
Ministério das Mulheres emitiu nota para dizer que o texto preocupa. Afirmou
ainda que a resolução do Conanda visa proteger os jovens.
"A necessidade dessas
diretrizes é uma resposta a um cenário alarmante. Entre 2013 e 2023, o Brasil
registrou mais de 232 mil nascimentos de mães com até 14 anos, idade inferior à
do consentimento, ou seja, são gestações infantis decorrente de estupro de
vulnerável. Embora a lei garanta o aborto legal em casos de estupro, milhares
de meninas são forçadas à maternidade anualmente. Em 2023, apenas 154 meninas
em todo o país conseguiram acessar esse direito", afirmou a pasta.
A aprovação do projeto que susta
a resolução do Conanda ocorreu a despeito de uma intensa atuação do governo
para derrubá-lo.
A mobilização, que incluiu os
ministérios dos Direitos Humanos, da Justiça e das Mulheres e a Secretaria de
Relações Institucionais, se iniciou há mais de dois meses, quando ficou claro
que o texto poderia avançar na Câmara dos Deputados. Nesta semana, foi
intensificada.
Notas técnicas elaboradas pelas
pastas vinham respaldando a atuação do governo na tentativa de convencer
deputados a se posicionarem contra a pauta.
Um desses documentos, feito pelo
Ministério da Justiça, rebatia ponto a ponto o Projeto de Decreto Legislativo.
Segundo a nota, a resolução do
Conanda não cria hipóteses novas para a realização do aborto, mas assegura que
os serviços de saúde não imponham barreiras sem amparo legal para os casos já
previstos em lei.
A mobilização governista
contrastou com a posição adotada pela gestão Lula em dezembro de 2024, quando a
resolução do Conanda foi aprovada.
Na ocasião, a Casa Civil atuou
para derrubar a medida depois de não chegar a um consenso com integrantes da
sociedade civil. Todos os 13 representantes do governo no conselho votaram
contra.
Desta vez, havia o entendimento
de que a aprovação do projeto pode enfraquecer a própria atuação do Conanda em
temas relacionados a crianças e adolescentes.
Resolução
A norma do Conanda diz que toda
criança e adolescente tem direito a ter acesso a informações sobre seu próprio
corpo que permitam a identificação e denúncia de situações de violência sexual.
A resolução garante à criança e
ao adolescente vítima de estupro o direito de acesso à informação sobre o
aborto "assegurando-lhe a autonomia" para escolher interromper a
gravidez de maneira "segura e protegida".
"A ausência dos pais ou
responsáveis legais não impede o pleno exercício do direito à informação de
crianças e adolescentes, sendo obrigatório que todas as informações e
esclarecimentos sobre a interrupção da gestação sejam fornecidas de forma clara
e acessível", destaca a norma.
O texto afirma que a criança ou
adolescente tem o direito de ser acompanhado em todos os procedimentos
necessários do aborto por um integrante do órgão do Sistema de Garantia de
Direitos das Criança e do Adolescente.
A resolução diz que os estados
devem trabalhar para descentralizar os serviços de aborto legal, especialmente
em regiões de difícil acesso.
"É dever do Estado, da
família e da sociedade respeitar a autonomia de crianças e adolescentes em
relação ao exercício de seus direitos, abstendo-se de qualquer ato que
constranja, ameace ou provoque medo, vergonha ou culpa em decorrência da
decisão de interromper a gestação".
A resolução assenta que os
profissionais responsáveis pelo atendimento das crianças e adolescentes devem
consultar os menores a respeito de notificação dos pais.
Se a presença dos responsáveis
puder causar "danos físicos, mentais ou sociais à criança ou adolescente,
e se ela tiver capacidade de tomada de decisão", o profissional deve
garantir a realização do procedimento mesmo sem consentimento dos pais.
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