Mesmo sem conseguir equacionar a crise que marca as finanças nos
Estados, com queda de arrecadação e aumento de despesas com itens como a
folha de pagamento de servidores públicos, a maioria dos governadores
vai disputar a reeleição neste ano, de acordo com levantamento feito
pelo Estado. Nos 26 Estados e no Distrito Federal, 16 governadores vão
tentar um novo mandato nas eleições 2018 – o maior número desde o pleito
de 2006, quando 17 apostaram na reeleição.
Em um período de três anos, as contas dos Estados saíram de um
resultado positivo de R$ 16 bilhões para um déficit de R$ 60 bilhões no
fim de 2017. Além de gastos em alta, os governadores que saírem com
vitória das urnas em outubro terão de herdar também os efeitos de uma
das piores recessões da história recente do País, que custou aos Estados
R$ 278 bilhões entre 2015 e 2017.
Diante de números tão negativos, que poderiam afetar a preferência
dos eleitores, a explicação dada por analistas é de que existe uma
desvinculação dos Executivos estaduais do cotidiano da população,
acostumada a culpar mais as gestões municipais e federal pelos problemas
na prestação de serviços e na administração do caixa público. “Os
governos estaduais são essencialmente prestadores de serviço e
administradores de parte da infraestrutura do Estado”, disse o cientista
político Fernando Schüler, do Insper.
“Isso faz com que o índice de reeleição dos governos seja favorável”,
afirmou Schüler. Segundo ele, o fato de os Estados não serem
responsáveis por formular políticas econômicas, questões como o
desemprego acabam não sendo vinculadas aos governadores. “Mesmo com um
presidente mal avaliado, o governador pode oferecer retórica positiva
que o afaste da crise.”
A deterioração das contas atinge a maioria das administrações, mas é
mais nítida em Estados como Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do
Sul e Rio Grande do Norte – onde desde 2015 falta dinheiro para pagar em
dia os salários de quase 100 mil trabalhadores com vínculos com o
Executivo local e o décimo terceiro de 2017 ainda não foi depositado
para quem ganha acima de R$ 4 mil. Como alternativa, o governador
Robinson Faria tem recorrido ao Fundo Financeiro do Instituto de
Previdência dos Servidores Estaduais. Desde que assumiu o cargo, em
2015, ele já sacou R$ 1 bilhão desse fundo.
Filiado ao PSD, Faria é um dos atuais governadores que vai se lançar à
reeleição, desta vez embalado por uma coligação de 12 partidos, entre
eles, o PSDB, PRB, PTB e PR. Procurado, o governador não falou sobre a
situação do Estado até a conclusão desta edição. Mas, durante a
convenção que confirmou seu nome ao governo potiguar, disse que o
enfrentamento da crise o impediu de entregar as obras prometidas.
O fato de os governadores não serem identificados com as crises, na
avaliação de Schüler, ajuda partidos nacionalmente afetados pela
recessão, como é o caso do PT. “Apesar de todas as questões do PT, seus
governadores vão bem nas pesquisas, mesmo que nacionalmente o partido
tenha recuado”, afirmou ele. É o caso do governador da Bahia, Rui Costa
(PT), que tentará mais quatro anos. “Não posso comentar a decisão dos
outros 15 governadores, mas tenho a convicção de que tomei a decisão
acertada. Atendi à vontade de um grande grupo político e da maioria dos
baianos, que tem avaliado positivamente minha gestão”, afirmou ele.
Crônico. Exceção nesse panorama, segundo Schüler, é o Rio Grande do
Sul, que desde 1998 nunca reelegeu um governador. “Lá o déficit fiscal é
um problema crônico. Trata-se de um Estado que presta mal os serviços,
onde é difícil governar e fazer reformas. Sartori tentou fazer algumas,
mas não teve sucesso.” Falando em continuidade e de “não fugir da raia”,
o governador gaúcho José Ivo Sartori (MDB) também oficializou a sua
candidatura à reeleição.
“Fui chamado a concorrer à reeleição para dar continuidade aos
projetos de modernização de gestão e controle da máquina pública”, disse
ele ao Estado. No primeiro semestre de 2018, mesmo com a ênfase ao
ajuste fiscal, o rombo mais do que dobrou em relação a igual período de
2017. A previsão é que o novo governador tome posse com um buraco
avaliado em R$ 4 bilhões.
Receita total retrocede a patamares de 2012
Com a crise econômica, a receita total dos Estados retrocedeu a níveis semelhantes aos de 2012. Em valores atualizados, há seis anos eles somavam R$ 636,6 bilhões (montante que considera a arrecadação de impostos estaduais e as transferências feitas pelo governo federal). Em 2017, a mesma cifra ficou em R$ 631 bilhões.
“A queda foi espetacular. Não é que parou de crescer. Houve uma
redução de receita muito radical, isso a despeito dos esforços dos
Estados para aumentá-la”, disse o economista Claudio Hamilton Matos dos
Santos, diretor de políticas macroeconômicas do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea).
Entre 2014 e 2016, a receita total retrocedeu 6,2%, para depois, em
2017, apresentar uma tímida melhora. Se essa recuperação se mantiver no
patamar registrado no ano passado, de 1,6%, os Estados só vão ter uma
receita próxima à de 2014 em 2020, apontam cálculos do diretor do Ipea.
“A boa notícia é que parou de cair. Mas a tendência de recuperação é
muito fraca.”
Sem dinheiro em caixa e com uma folha de pagamentos crescente por
causa do maior número de aposentados, os Estados pararam de contratar e
tiveram de cortar investimentos, em uma tentativa de fazer as contas
fecharem. “Na prática, o que aconteceu é que, se o governo ia comprar um
carro para a Polícia, acabou não comprando. Teve Estado que quase zerou
os investimentos e agora está, lentamente, voltando”, disse ele.
No Rio de Janeiro, por exemplo, além de ter ocorrido atrasos nos
pagamentos de salários e aposentadorias, a redução dos investimentos foi
de 62% em 2016, segundo o último boletim sobre situação fiscal dos
Estados feito pelo Tesouro Nacional.
A economista Vilma Pinto, pesquisadora do Instituto Brasileiro de
Economia (Ibre), da FGV, disse que nos últimos oito anos, enquanto os
investimentos totais dos Estados recuaram 3,1%, o gasto com pessoal
avançou 4%. Ela lembra que houve um desencontro entre receitas, que
apresentam um comportamento cíclico, e despesas, que são constantes. / COLABORARAM LUCIANA DYNIEWICZ e RICARDO ARAÚJO, ESPECIAL PARA O ESTADO
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