O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles,
suspendeu nesta segunda-feira, 14, todos os convênios e parcerias da
pasta e autarquias com organizações não governamentais pelos próximos 90
dias.
Também
pediu um levantamento de todos os desembolsos efetuados por fundos do
ministério, como Fundo Clima, Fundo Nacional do Meio Ambiente e Fundo
Amazônia que tenham como beneficiários organismos do terceiro setor.
E determinou que todos os convênios, acordos de cooperação,
atos e projetos do Ibama, do Instituto Chico Mendes para a Conservação
da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto de Pesquisas Jardim Botânico
do Rio de Janeiro feitos com ONGs deverão ser remetidos para anuência
prévia do gabinete.
Procurado pela reportagem, o ministério, em
nota, disse que “a motivação do levantamento dos desembolsos efetuados
pelos fundos geridos pelo ministério, bem como a sua suspensão
temporária, tem por objetivo a avaliação dos mesmos. Na análise, serão
examinadas as condições, prazos e volumes dos acordos pactuados”.
Segundo
a pasta, o “diagnóstico permitirá a avaliação daqueles que têm
condições de ter continuidade, bem como dos que eventualmente mereçam
reparos”.
Não ficou claro, porém, quais contratos, em quais
lugares, exatamente devem ser afetados. Nem o valor deles. Funcionários
da pasta, em condição de anonimato, afirmaram que a decisão pode afetar
ações concretas em conservação, como o projeto Arpa, que atua em áreas
protegidas da Amazônia. Considerado o maior e mais bem sucedido programa
de proteção de floresta tropical do mundo, ele atua em 60 milhões de
hectares e já teve aplicação de cerca de R$ 500 milhões.
A pasta
tem convênios também de recuperação florestal, agroextrativismo,
agricultura familiar, trabalhos com povos indígenas, entre outros.
Estima-se que todos os projetos hoje apoiados pelo Funbio (Fundo
Brasileiro para a Biodiversidade), que gere recursos provenientes do
Banco Mundial e do Fundo Mundial para o Ambiente (GEF) podem ser
paralisados.
Também não dá para entender exatamente como fica a
situação dos projetos financiados pelo Fundo Amazônia e pelo Fundo
Clima. Os dois são geridos pelo BNDES, e os contratos são fechados entre
os bancos e as organizações. Em teoria, não cabe ao Ministério do Meio
Ambiente, unilateralmente, fazer essa suspensão. A carteira de projetos
do Fundo Amazônia com o terceiro setor contém hoje 52 projetos
contratados, com apoio de cerca de R$ 600 milhões.
ONGs vêm sendo alvos de ataques
do presidente Jair Bolsonaro desde as eleições. Ele criticou, por
exemplo, o programa de conversão de multas do Ibama. Pelo projeto,
empreendedores com grandes valores de multas a pagar ao Ibama, como a
Petrobrás, recebem um desconto de 60% no valor se empregarem o restante
em projetos de recuperação ambiental.
Em reunião com
parlamentares do DEM em dezembro chegou a dizer: “Nós respeitamos o meio
ambiente, mas, pessoal, não dá mais para conviver com a indústria da
multa”, antes de mencionar o programa. “Tem decreto que destina 40% das
multas para ONG’s para preservar meio ambiente. O que vamos fazer com
aquele decreto? Cair fora”, disse Bolsonaro. “Não vamos deixar esse
pessoal se retroalimentar constantemente trabalhando contra nós”,
continuou.
Esses projetos podem ser tocados por organizações sem
fins lucrativos, como ONGs, ou mesmo pelo poder público, mas a maioria
dos inscritos no primeiro edital foram as ONGs. No total, para o
primeiro chamamento de projeto, foram arrecadados R$ 1 bilhão para o
reflorestamento das bacias do São Francisco e do Parnaíba. Há um temor
dentro do Ibama de que a nova medida afete esses contratos.
Além
disso, em MP publicada logo no primeiro dia de governo, Bolsonaro
determinou à Secretaria de Governo “supervisionar, coordenar, monitorar e
acompanhar as atividades e ações dos organismos internacionais e das
organizações não governamentais no território nacional”.
Repercussão
Em
nota, um coletivo de ONGs, criticou a medida. Para o grupo, a suspensão
dos convênios "fere o princípio da legalidade e levanta, sem elementos
mínimos de prova, dúvidas sobre a idoneidade da sociedade civil". Na
visão das organizações, "o ministro adota, sem base legal e sem
motivação, medida sancionatória genérica extrema, com potencial de
causar descontinuidade na gestão ambiental federal. O prejuízo será do
meio ambiente, que em tese Salles deveria proteger, e de populações
vulneráveis em todo o País".
O texto, assinado por Grupo de
Trabalho Amazônico (GTA), Instituto Ethos, Plataforma MROSC
e Observatório do Clima, cita ainda a lei 13.019/2014, conhecida como
Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC). "Em vigor
desde janeiro de 2016, regulamenta as relações entre governos e
organizações da sociedade civil. Ela só prevê a suspensão como sanção,
medida que só deveria ser tomada após abertura de processo
administrativo em que o interessado tenha direito ao contraditório e à
ampla defesa.
O ato do ministro do Meio Ambiente, Ricardo
Salles, não apresenta qualquer justificativa, o que viola o princípio
constitucional da motivação dos atos administrativos."
Garoto bem mandado.
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