Diante do bispo Rogério Formigoni, um dos homens fortes da Igreja
Universal do Reino de Deus, um homem que aparenta incorporar uma
entidade demoníaca ataca várias igrejas evangélicas e também a católica.
Chama Nossa Senhora Aparecida de desgraçada e, incentivado pelo líder
religioso, vai elencando várias denominações concorrentes à Universal
que estariam sob domínio de forças do mal.
No final do depoimento, dado durante um culto gravado, Formigoni diz à
plateia de fiéis: “Olha pra mim, não é sério isso? Pior de tudo é que
tem uma multidão indo pro inferno dentro de uma igreja com uma Bíblia
embaixo do braço”.
O vídeo viralizou no meio evangélico, e seu estrago, segundo pastores
com quem a Folha conversou, pode ser comparável ao episódio em que
outro bispo da igreja de Edir Macedo chutou uma imagem de Aparecida,
durante pregação televisionada em 1995 —um dos momentos de maior atrito
entre a Universal, que, como outras evangélicas, critica a adoração a
santos, e a Igreja Católica.
Assista aqui
Em nota publicada em seu site no domingo (10), a Universal disse que
repudia a atitude de seu bispo e reproduz vídeo em que ele pede “perdão a
todas as igrejas” pela gravação com “um espírito que eu estava
entrevistando”.
O depoimento do fiel que parece estar endemoniado movimentou o grupo
de WhatsApp com integrantes da bancada evangélica no Congresso. Líder do
PRB e bispo licenciado da Universal, o deputado Marcos Pereira tentou
passar panos quentes e enviou o link com a retratação de Formigoni.
Foi recebido com certa descrença. “Com todo o respeito ao líder
Marcos Pereira, não é a primeira vez que um bispo da Universal ataca os
pentecostais. Bispo Macedo comparou em seu blog nossos cultos a centros
espíritas”, disse por lá o deputado Marco Feliciano (Pode-SP), que
representa o Ministério Belém da Assembleia de Deus, citada pela suposta
entidade. Boa parte do segmento evangélico vê credos espíritas e
afrobrasileiros (como umbanda e candomblé) como algo demoníaco.
Esse pedido de desculpas, continua Feliciano, é “uma vergonha”, e a
nota da Universal passa longe de curar “a ferida aberta” com outras
agremiações. À reportagem ele diz que “a retratação do Formigoni parece
tentar subestimar a inteligência dos pentecostais”.
A Igreja Quadrangular, outra mencionada, espera um pedido de
desculpas particularizado, afirmou em seguida o deputado e pastor
Stefano Aguiar (PSD-MG).
Na nota, a Universal diz que “uma das virtudes de um ministro
evangélico é o discernimento espiritual. Acreditamos que Formigoni
aprendeu, com este erro, a necessidade de desenvolver esta virtude”.
“Eu quero os nomes das igrejas que você lidera”, Formigoni questiona o
fiel no vídeo que tanta polêmica gerou, que dura seis minutos e já foi
retirado de seu canal virtual. Assembleia de Deus, Presbiteriana, Cristã
Contemporânea, Batista, Plenitude do Trono de Deus e grande elenco
estão entre as denominações históricas, pentecostais e neopentecostais
criticadas.
A igreja mais atacada é a conduzida pelo apóstolo Valdemiro Santiago.
Ele criou sua Mundial do Poder de Deus como uma costela da Universal,
da qual fazia parte até 1998, quando se desentendeu com o líder da
igreja, o bispo Edir Macedo.
“Aquele desgraçado tá aqui na minha mão, um dia foi do altar
nojento”, diz o homem supostamente tomado pela entidade demoníaca. Em
seguida, ele imita de forma zombeteira o que seria Valdemiro pedindo
auxílio a seus fiéis para manter seu programa de TV: “Me ajuda, eles
estão querendo tirar meu programa, me ajuda, povo de Deus”.
Igrejas que não priorizam a cultura do dízimo também entram na
berlinda. Caso da Deus É Amor, uma das mais conservadoras. “A mulher não
pode se arrumar pro marido, é por isso que tem muito casamento
destruído”, diz a “entidade” entrevistada no púlpito.
Formigoni indaga como a mulher deveria se vestir nessa igreja sob
guarda do diabo. A resposta vem acompanhada de uma gargalhada: “Toda
derrotada. Não pode passar uma maquiagem, não pode arrumar o cabelo, não
pode depilar”.
“A sua doutrina lá na católica, como é que é?”, ele questiona a certa
altura. Reação: “Comodismo, aceitação de qualquer coisa, zona de
conforto, aceita a mesmice, aceita a derrota, não pratica a fé, acha que
tudo tá bom, e eles adoram, adoram, adoram as imagens. Só que eles não
sabe que, por trás de cada uma, eu estou dentro de cada uma delas. Essa
Aparecida aí desgraçada, toda pessoa que adora ela adora a Iemanjá”.
O bispo questiona mais de uma vez se os templos de Edir Macedo seriam
eles também operados por forças diabólicas, e a reação é sempre
negativa. “Muitos falam que a Universal paga para as pessoas
manifestarem entidade, só que tem igreja aí [ri] que é tudo teatro, só
idiota pra não ver”, diz o homem.
“Tem alguma coisinha na Universal que é sua, que é implementação sua?”, insiste Formigoni. “Não, maldito. [Ela] não se mistura”
Em 2012, a Folha testemunhou um culto em que Macedo investia contra o
avanço de outras igrejas evangélicas, como a Mundial e a Internacional
da Graça de Deus (R.R. Soares, casado com uma irmã do bispo da
Universal). “Não ouça nenhum pastor. Fixe-se aqui”, instruiu bispo
Macedo.
Ele usou a metáfora de “misturar vinhos” para afirmar que o fiel deve escolher apenas uma denominação para seguir.
Nossa.
Folha de São Paulo
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