Dilma Rousseff teria concluído o seu segundo mandato presidencial se o
Supremo Tribunal Federal não tivesse barrado a posse de Lula na chefia
da Casa Civil. Foi o que disse o ex-presidente Michel Temer em
entrevista ao programa Roda Viva, na noite desta segunda-feira (16). “Se
ele fosse chefe da Casa Civil, é muito provável —ele tinha bom contato
com o Congresso Nacional— que não se conseguiria fazer o impeachment.
Disso não tenho dúvida”.
Com sua avaliação, Temer realçou indiretamente o papel de dois
protagonistas da deposição de Dilma: Sergio Moro e Gilmar Mendes. Como
juiz da Lava Jato, Moro levantou em março de 2016 o sigilo do célebre
grampo em que Dilma avisa a Lula que o “Bessias” estava a caminho,
levando o ato de sua nomeação para o ministério. Coube a Gilmar, na pele
de ministro do Supremo Tribunal Federal, expedir a liminar que sustou a
posse de Lula. Seis meses depois, Dilma foi deposta.
A divulgação do áudio da fatídica conversa desceu ao verbete da
enciclopédia como uma transgressão de Moro. O então juiz já havia
ordenado à Polícia Federal a suspensão da escuta. O diálogo soou antes
que a ordem fosse executada. Nele, Dilma disse a Lula que o ato de
nomeação deveria ser usado em caso de necessidade. Ficou subentendido
que o documento serviria como um salvo-conduto para evitar a prisão de
Lula, que passaria a dispor do foro privilegiado do Supremo.
Temer lembrou que Moro foi censurado na época pelo então relator da
Lava Jato no Supremo, ministro Teori Zavascki, morto num acidente aéreo.
Pediu “escusas” à Suprema Corte. Alegou que não tivera a intenção de
causar “polêmicas e constrangimentos desnecessários”. Hoje, sabe-se que
essa desculpa é falsa. O vazamento de mensagens trocadas entre Moro e
procuradores revela que a intenção era mesmo a de jogar a conversa no
ventilador para evitar que Lula se escondesse atrás do escudo do foro
privilegiado.
A despeito da dúvida quanto à legalidade dos procedimentos de Moro,
Gilmar Mendes não hesitou em barrar a posse de Lula. Valeu-se de um
raciocínio ardiloso. Sustentou que o grampo tornara-se secundário depois
que Dilma e Lula reconheceram em manifestações públicas a autenticidade
do diálogo. Durante a gestão de Temer, Gilmar consolidou-se como um
conselheiro do presidente. Hoje, é um crítico da heterodoxia judicial da
Lava Jato e adepto da política de celas abertas.
Temer avalia que a conversão de Lula em ministro era mesmo uma
manobra: “Tudo indicava que o chamamento do ex-presidente Lula para a
Casa Civil não tinha exatamente a finalidade de nomeá-lo para a Casa
Civil, mas, eventualmente, impedir que houvesse algum embaraço de
natureza judicial em relação a ele.” Com atraso de mais de três anos,
tachou de “equívoco muito grande” a divulgação ordenada por Moro.
“Se divulgou um telefonema, dever-se-ia liberar por inteiro”, afirmou
Temer, referindo-se a duas dezenas de conversas telefônicas que Lula
mantivera após a suspensão do grampo. Dialogara com o próprio Temer.
Dizia estar impressionado com a manifestação que arrastara dias antes
3,6 milhões de pessoas às ruas, para apoiar a Lava Jato e protestar
contra o governo Dilma. Buscava uma aliança com parceiros de infortúnio,
pois a Lava Jato cercava também o MDB de Temer.
“Ele estava preocupado com o impeachment”, relatou Temer na
entrevista. “Depois, ele esteve comigo, conversando sobre o impedimento.
Pedia que eu colaborasse com o PMDB. Afinal, a derrubada da
ex-presidente não seria útil para o país. O fundamento básico dele foi
tentar trazer o MDB e outros a quem eu pudesse influenciar no sentido de
negar a possibilidade do impedimento.”
Perguntou-se a Temer se estava disposto a socorrer Dilma na ocasião
em que Lula o procurou. E ele: “Quando o presidente da Câmara era o
Eduardo Cunha eu trabalhei muito. […] Houve um dia em que eu fui à
Presidência da República e disse: ‘presidente, eu acho que o Eduardo
Cunha não vai propor nenhum pedido de impeachment”.
Havia nas gavetas de Cunha duas dezenas de pedidos de afastamento de
Dilma. “Dois são complicadíssimos”, disse Temer à então presidente. “Mas
ele não vai pedir, deve arquivar todos. Ela disse: ‘Que coisa boa,
Temer’. Chamou um ministro que estava ao nosso lado e disse: ‘Olha o que
o Temer está dizendo!’. Ou seja, na verdade eu jamais imaginei que
chegaria à Presidência, sobretudo por essa via”. O repórter ironizou: O
senhor nunca conspirou nem um pouquinho? “Não”.
Instado a avaliar a gestão de Jair Bolsonaro, Temer referiu-se ao
capitão como um continuador de sua obra: “O governo Bolsonaro tem um
ponto positivo. Esse ponto positivo, modéstia de lado, é porque ele está
dando sequência a tudo aquilo que eu fiz”.
Nossa...
JOSIAS DE SOUZA
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