Um dos dois primeiros colocados nas pesquisas eleitorais, o candidato a presidente Jair Bolsonaro
(PSL) tem sido cobrado em entrevistas sobre suas propostas para saúde e
educação. Ele terá de mostrar até outubro o que quase não mostrou em
seus 27 anos de mandato na Câmara.
Dos mais de 150 projetos apresentados por ele nesse período, apenas
um trata de educação. Outros dois versam sobre saúde. Em contrapartida, o
deputado apresentou pelo menos 32 propostas voltadas para os militares,
categoria da qual é originário.
A única proposição de Bolsonaro ligada à educação foi apresentada há
27 anos, em 1991, quando o ex-militar estava estreando no Congresso.
Por outro lado, já apresentou projetos para autorizar o porte federal de
arma de fogo aos congressistas e padronizar manifestações de aplausos
após a execução do Hino Nacional.
O ex-capitão do Exército, chamado de “mito” por seus eleitores, pouco conseguiu aprovar no Congresso.
Segundo levantamento da Sigalei, plataforma que usa inteligência
artificial para monitorar e organizar dados legislativos, dos 147
Projetos de Lei Ordinária que o deputado apresentou de autoria própria,
somente um virou lei: o PL 2.514/1996, que estende o benefício de
isenção do Imposto sobre Produto Industrializado (IPI) para bens de
informática e automação.
Dois projetos de autoria do deputado foram aprovados pela Casa
legislativa, mas vetados pela Presidência da República. O primeiro foi o
PL 4.326/2008 que incentiva estudantes de medicina a estagiar nas
Forças Armadas, e o segundo foi o PL 5.982/2009 que autoriza o porte de
arma para agentes e guardas prisionais integrantes de escoltas de presos
e para guardas portuárias.
Kit gay e saúde masculina
Na educação, atuou para vetar a distribuição do “kit gay”, material
que abordava a temática homossexual no ambiente escolar, do que propor
projetos na área.
Nas redes sociais, fez campanha contra o projeto e distribuiu
panfletos em escolas alegando que o MEC e grupos LGBTs incentivam a
homossexualidade. “Querem, na escola, transformar seu filho de 6 a 8
anos em homossexual!”, dizia cartilha distribuída à época.
Já na área da saúde, Bolsonaro foi um dos 19 coautores do PL
4.639/2016, que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética por
pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, conhecida como a “pílula
do câncer”. A lei foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Apresentou também o PL 1.127/2007, que institui a Semana Nacional da
Saúde Masculina. “Os homens são mais resistentes a buscar ajuda, não
apenas nos problemas de saúde. São muito menos aplicados do que as
mulheres no conhecimento e controle dos fatores de risco das doenças que
os acometem com maior frequência”, justifica no projeto.
Contra o próprio projeto
Dentro do Congresso, onde está no seu sétimo mandato, já recebeu
denúncias por má conduta e por declarações polêmicas. Ao disputar a
presidência da Câmara, no ano passado, conseguiu apenas quatro votos e
ficou em último lugar.
Além disso, apresentou um projeto em tom de chacota, admitindo na
justificativa que, apesar de autor, ele mesmo votaria contra a
proposição. Em 2006, quando se discutia na Câmara dos Deputados o
sistema de cotas para negros nas universidades, Bolsonaro, que era
contra a proposta, apresentou o PLP 354/2006. O texto garante 50% das
vagas para deputados federais às populações negras e pardas.
“O exemplo tem que vir desta Casa que, por essência, é a legítima
representação do povo e, assim sendo, deve possuir de forma proporcional
representantes de todos os segmentos sociais”, diz no projeto. Porém na
mesma proposta, ele complementa: “Mesmo sendo autor da proposição, por
coerência, votarei contra esta matéria”.
Apesar do longo tempo no Congresso, Bolsonaro ganhou fama nos
últimos anos após demonstrar interesse em participar da corrida
eleitoral e por se apresentar como solução aos políticos tradicionais,
desgastados depois dos grandes escândalos de corrupção. Mas esses mesmos
políticos de carreira não têm demonstrado tanta afinidade com o “mito dos pés de barro”.
A falta de apoio a Bolsonaro no Congresso ficou evidente quando o
deputado disputou a Presidência da Câmara, em 2017, e amargou o último
lugar, com apenas quatro votos. Ele sequer teve o voto do próprio filho,
o também deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) – mas, neste caso, com
direito a bronca no herdeiro, que estava fora do Brasil naquela ocasião. O parlamentar também concorreu ao posto em 2005 e 2011, ambas as vezes sem sucesso.
Nas redes
Conhecido por defender opiniões conservadoras, o ex-capitão do
Exército atraiu seguidores em todos os cantos do país e seu nome começou
a liderar pesquisas de intenção de voto.
No último levantamento do Datafolha, em junho deste ano, Bolsonaro
lidera o índice de intenção de voto (19%) no cenário sem o ex-presidente
Lula, preso desde abril.
O deputado conseguiu criar uma grande rede de apoio na internet. Em
2017, Bolsonaro foi considerado o parlamentar mais influente nas redes
sociais, segundo levantamento da FSB Comunicação.
No período analisado, que vai de 2 de fevereiro, início do semestre
legislativo, a 31 de dezembro do ano passado, o deputado fez 709
postagens no Facebook, onde tinha 4,9 milhões de seguidores, e 973 no
Twitter, com 834,7 mil seguidores.
O presidenciável conseguiu com as duas plataformas, em números
absolutos, um total de 21,47 milhões de interações, incluindo curtidas,
comentários e compartilhamentos, segundo dados da pesquisa da FSB.
Gênese
Bolsonaro ingressou na vida política elegendo-se vereador do Rio de
Janeiro pelo Partido Democrata Cristão (PDC) em 1988. A primeira disputa
ao Congresso foi em 1990 pelo mesmo partido.
Na última eleição, em 2014, foi o deputado mais votado no seu estado, Rio de Janeiro, com 464.572 votos.
O candidato à presidência aproveita o desgaste de partidos
tradicionais, como o PT e PSDB, para fazer seu palanque. Orgulha-se de
não ser alvo de qualquer investigação da Lava Jato e não estar envolvido
em casos de corrupção, mas já foi alvo de outras acusações,
principalmente por conta de suas declarações e condutas no parlamento.
Em 2016, foi denunciado no Supremo por injúria e apologia ao estupro
após ter afirmado que não estupraria a deputada Maria do Rosário
(PT-RS) porque ela “não merece”. No ano passado, foi condenado a
indenizar a deputada em R$ 10 mil.
O deputado também é recordista de processos no Conselho de Ética da Câmara, com quatro representações, conforme revelou o Congresso em Foco em agosto do ano passado.
Sem filtros para ofender os colegas, o parlamentar já chamou Dilma
Rousseff de homossexual e “especialista em assalto e furto” e disse que o
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) deveria ter sido
fuzilado durante a ditadura.
Também já fez declarações de cunho racista. Em palestra no Rio de
Janeiro no ano passado, Bolsonaro disse que, se eleito, acabaria com
todas as reservas de terra indígena e de quilombolas. “Eu fui num
quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Nem para
procriador ele serve mais”.
Leia algumas propostas do deputado para as seguintes áreas:
SEGURANÇA
Uma das bandeiras mais defendidas pelo deputado é a da segurança
pública. Bolsonaro escreveu alguns projetos na área, entre eles o PL
7.282/2014, que autoriza o porte de armas.
“Poderá ser concedido porte de arma de fogo para pessoas que
justificarem a necessidade para sua segurança pessoal ou de seu
patrimônio”, escreveu Bolsonaro.
Na justificativa do projeto, o deputado diz que “o porte de arma de
fogo é um direito a ser exercido por quem tenha real necessidade e
atenda aos requisitos estabelecidos na legislação em vigor, sem
exigências demasiadamente restritivas. Aqueles que forem contra, basta
optarem por não portarem armas”.
A proposta autoriza o porte de arma para advogados, colecionadores,
profissionais de mídia que atuam na cobertura policial, senadores,
deputados, prefeitos, governadores e qualquer pessoa que justifique a
necessidade para segurança pessoal.
“Pelo direito à legítima defesa própria, de seus familiares e de seu
patrimônio, peço o apoio de meus pares para que seja aprovada a
presente proposição, obrigando aos marginais pensarem duas vezes antes
de cometerem seus crimes, já que encontrarão resistência à altura de
seus atos por parte das pessoas de bem, dispostas a enfrentá-los”,
escreve o deputado na proposta.
Sugeriu também o PL 2.751/1992, que repassa um montante específico
da verba de segurança pública para a construção de residências para uso
dos integrantes da força de policiamento ostensivo.
O PL 3.075/1997 autoriza o porte federal de arma de fogo aos
congressistas. “Em face dos constantes deslocamentos a que os
congressistas são obrigados, por força do exercício da função, é que
vemos a necessidade de levarmos à apreciação dos ilustres pares a
presente propositura”, diz o projeto.
Já o PL 8.176/2014 acresce inciso ao Código Penal, tornando
hediondos os crimes cometidos contra as vidas de servidores da segurança
pública e seus familiares.
O deputado também propôs o PL 5.825/2016 que dispõe sobre as ações
contraterroristas. “Não podemos nos apoiar no fato de que o Brasil não
tem sido, aparentemente, alvo do terrorismo internacional para deixar de
nos precaver contra essa ameaça”, justifica no projeto.
Neste ano apresentou o PL 9.564/2018, que estabelece a “excludente
de ilicitude” nas ações de agentes públicos em operação sob intervenção
federal.
“O que se busca por meio do presente projeto são os anteparos
necessários para que se garanta a devida segurança jurídica ao exercício
da atividade policial”, diz o texto.
O projeto está aguardando parecer do relator na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado (CSPCCO).
SAÚDE
Além do PL 4.639/2016, que autoriza o uso da fosfoetanolamina
sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, conhecida
como a “pílula do câncer”, e do PL 1.127/2007, que institui a Semana
Nacional da Saúde Masculina, o parlamentar sugeriu dois projetos para a
área da saúde, ambos muito parecidos, especificamente para militares.
O primeiro foi o PL 1.472/1991, que assegura o atendimento médico
ambulatorial e hospitalar aos ex-combatentes. O segundo, o PL
2.712/2000, que dispõe sobre a assistência médico-hospitalar aos
ex-combatentes que tenham participado de operações bélicas durante a
Segunda Guerra Mundial.
EDUCAÇÃO
A sua única proposta para a área foi o PL 2.332/1991, que estabelece
redução de impostos federais nas cobranças de taxas, mensalidades e
emolumentos nos estabelecimentos de ensino para famílias com mais de um
filho: redução de 20% para o segundo filho, 40% para o terceiro filho e
60% para o quarto e seguintes filhos. O projeto foi apresentado em seu
primeiro ano de mandato e está arquivado.
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